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  • Foto do escritorWilFran Canaris

A gênese do Corporativismo - Os bancos no nascimento do capitalismo brasileiro


A década de 30 foi cheia de anos ruins. Na Itália e na Alemanha, as vozes de Mussolini e Hitler prenunciavam a intolerância nazi-fascista que levaria, em 1939, à eclosão do pior confronto da história da humanidade. Por aqui, Vargas realizava a primeira década de seus 15 anos de governo, inaugurando as primeiras leis que conformariam o arcabouço jurídico a atrelar o movimento sindical ao Estado.


Em 1935, o governo de Getúlio Dornelles Vargas vivia turbulências em suas bases de sustentação política. Esfacelava-se lentamente a aliança entre os militares rebeldes de 1922 e 1924 e os políticos de oligarquias regionais de fora de São Paulo e Minas Gerais, que tornara possível a vitória da Revolução de 30. Os catarinenses sentiam que esvaziava a sua participação na fatia do poder. "A Revolução de 30 desarticulou a vida intelectual de Florianópolis, introduziu um grande contingente gaúcho no interior do estado, acentuando a subordinação local aos interesses do estado vizinho e, por consequência, o afastamento de catarinenses dos centros de decisão do governo federal", afirma Glauco Carneiro. Se antes de 30, os catarinenses ecoavam suas opiniões pela voz de Lauro Müller, José Pinto da Luz, Arnaldo Pinto da Luz, Nestor Sezefredo Passos e Victor Konder, agora restava o silêncio.


Getúlio, reeleito indiretamente, governava escorado nas transformações políticas aplicadas pela Constituição de 1934. O controle definitivo sobre as manifestações de operários que ganhavam mais e mais importância e sobre as divergências políticas evidentes em sua base de sustentação só chegaria dois anos depois - a ·10 de novembro de 1937, quando a decretação do Estado Novo apagaria as luzes da democracia no país durante oito longos anos.


A Constituição de 34 reconhecera a necessidade de atender a alguns interesses da classe trabalhadora. O país deixava de -ser eminentemente rural, para desenvolver a indústria nacional. Com o operariado, vieram novos sindicatos. Os funcionários civis e militares da União também mostravam sinais de organização, reivindicando reajustes salariais. A Constituição dera à União poderes para monopolizar indústrias e nacionalizar bancos de depósito e empresas de seguro. Adotava o princípio da pluralidade sindical e da completa autonomia dos sindicatos. Garantia pela primeira vez jornada de oito horas, repouso semanal obrigatório, férias remuneradas, indenização por demissão sem justa causa e licença remunerada à gestante. Proibia o trabalho a menores de 14 anos. A definição de leis precisas para regular o conflito entre capital e trabalho foi uma das principais preocupações do primeiro governo Vargas - como comprova a tabela ao lado. Mas, bem ao estilo cravo-e-ferradura de Getúlio Vargas, ao mesmo tempo em que consolidava avanços, o governo criava instrumentos de repressão das organizações populares. Foi através da Lei de Segurança Nacional, promulgada em março de 35, que o governo reprimiu com dureza a rebelião comunista de novembro em Recife, Natal e Rio de Janeiro. Decretou o estado de sítio prorrogado sucessivamente até o golpe do Estado Novo.


Sob a ditadura, o cenário do movimento sindical mudou radicalmente. A Constituição de 1937(a "Polaca", apelido que historiadores atribuem à sua inspiração no fascismo de Mussolini) estabeleceu novos paradigmas para a organização dos trabalhadores. A pluralidade foi substituída pela unicidade sindical e pela estrutura corporativa - organizada em sindicatos de base, federações e confederações, em pirâmides de categorias controladas pelo Ministério do Trabalho. Os pilares do corporativismo (ou Sindicalismo de Estado) estão presentes até hoje na legislação e no cotidiano dos sindicatos: unicidade (impedimento de organização de mais de um sindicato por categoria em cada base territorial), imposto sindical e o papel normativo da Justiça do Trabalho.


Da Constituição autoritária brotou a Consolidação das Leis do Trabalho, anunciada em 1º de maio de 1943. A CLT garantia direitos trabalhistas, mas detalhava a submissão dos sindicatos ao poder do Estado. Todas as organizações sindicais criadas com liberdade anteriormente precisaram buscar novos registros no Ministério do Trabalho - como aconteceu com o Sindicato dos Bancários de Santa Catarina.



Em 31 de março de 41, assembléia geral com 31 bancários catarinenses (mais de 2/3 dos só-cios) aprovou reforma do estatuto, conforme proposta feita por comissão eleita no final do ano anterior. Os bancários que coordenaram a reunião eram Raul Wendhausen (presidente da mesa),João Baptista Brandão de Proença (secretário da mesa) e Sylvio Rigueira Peluso. O sindicato tinha 144 filiados, cujos dados pessoais (idade, banco e outros itens) foram enviados para a DRT junto com a nova proposta de estatuto. A diretoria do Sindicato era integrada por João Cândido Rodrigues, Rubens Lehmkuhl e Nelson Moreira Netto. Em 14 de março de 42, nova assembléia geral com 34 associados (mais de 2/ 3 dos quites) definiu nova reforma no estatuto, em vista de não terem sido aceitos pelo DNT os estatutos aprovados na assembleia anterior.


Com isto, o Sindicato entrava com tudo no modelo corporativista e, sob as graças de Vargas, seria condenado a permanecer debaixo das asas do Estado. O populismo não era moleza. A cada ano, os sindicatos recebiam do governo um modelo de texto para enviar ao presidente Getúlio Vargas parabenizando-o pelo aniversário, lembra o ex-presidente do Sindicato, Carmelo Faraco.


Os bancos no nascimento do capitalismo brasileiro

A política nacionalista de desenvolvimento econômico impulsionou o sistema financeiro a atividades de fomento, mas conduziu as instituições públicas a vícios que se tornariam permanentes.


Os jornais de abril de 1934 descarregavam baterias contra a "desastrosa administração da Caixa Econômica". O presidente da empresa, Solano Cunha, para os jornais estaria realizando uma administração "contrária aos interesses dos depositários". As provas estavam nos balanços da empresa: "À sua entrada naquele instituto de crédito, havia um depósito no Tesouro de 300 mil contos de réis e agora há somente 130 mil contos, em vista dos empréstimos realizados, a maioria dos quais a Caixa Econômica nunca mais receberá, pois que 60 mil contos desses empréstimos são irresgatáveis". O Estado levantava suspeitas sobre um empréstimo de 30 contos de réis, fornecido a Batista Luzardo, homem de confiança do getulismo.


Os banqueiros da rede privada não tinham razões para lamentar do governo Vargas. A mais antiga instituição privada do país comemorava em 1944: "O período excepcional que atravessamos deu origem a um aumento rápido e extraordinário de disponibilidades, permitindo maior incremento das operações bancárias", informava relatório da diretoria do Banco Econômico da Bahia, apresentado aos acionistas.


A mudança da moeda - o mil-réis foi substituído pelo cruzeiro em 1942 - trouxe problemas para os bancários e mais estabilidade para os banqueiros. Enquanto os trabalhadores lutavam nas agências para não confundir as notas novas com as velhas (muito parecidas), nos escritórios os banqueiros comemoravam a mudança do padrão monetário como medida capaz de "contrabalançar o trabalho sorrateiro dos inimigos do Brasil, que procuravam demolir as bases da nossa economia". A guerra acirrava os sentimentos nacionalistas.


Com a destituição de Vargas, os banqueiros sonharam com os ares do capitalismo livre. Para o presidente do Banco Econômico , Miguel Calmon, o país vivia "uma fase de verdadeira estagnação econômica", apesar da "animação dos negócios". O problema era uma massa trabalhadora "desprovida de instrução adequada ao exercício de misteres mais desenvolvidos". A solução: incentivar a imigração, "visando o desenvolvimento de uma mentalidade capitalista no Estado".

 


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